Uma noite mais do que especial do Brasil
Texto de Daniel Bortoletto sobre o agora inesquecível 17 de maio de 2024
Admito que demorei para conseguir escrever este texto. Ele não poderia ser uma simples constatação da vitória do Brasil sobre os Estados Unidos, com fim de um incômodo tabu, em noite de um Maracanãzinho tomado por uma energia surreal. E o motivo é simples: pré e pós-jogo foram tão ou mais relevantes do que o próprio clássico.
A Seleção Brasileira feminina hoje carregou no peito da camisa algo que muitas das atletas já carregavam na alma: a luta contra o preconceito.
O preconceito que a mulher carrega. O preconceito que a mulher preta carrega. O preconceito que a mulher homossexual carrega. O preconceito que a mulher do Norte/Nordeste carrega. O preconceito que a mulher religiosa carrega. É tanto preconceito em um mísero parágrafo que os preconceituoso(a)s de plantão vão chamar de exagero ou mimimi.
Com Gabi e Sheilla puxando a fila, as jogadoras entraram em quadra de mãos dadas, inclusive com atletas do vôlei de praia. Na camisa de Nyeme e Natinha, líberos heterossexuais, as cores da bandeira LGBTQIA+ para mostrar que “com preconceito não tem jogo“. Slogam da campanha da CBV iniciada nesta sexta-feira cai como uma luva.
– O recado que fica: a gente não aceita mais. A gente vai bater de frente – disse a capitã Gabi, depois do jogo.
Discursos parecidos tiveram Carol, Rosamaria, Pri Daroit… Talvez não seja a geração delas a aproveitar uma sociedade menos preconceituosa. Mas é preciso usar o esporte sempre como exemplo para ter um mundo mais tolerante e representativo.
E essa chama de mudança foi plantada em um Maracanãzinho elétrico, pulsante e contagiante. O que foi aquilo, no quarto set, com a entrada de Carol e os bloqueios em sequência? De arrepiar a reação do público com a entrada da central e a sequência de lances dela na rede.
O quanto Gabi incendiou o time desde os pontos iniciais! Estava com aquele olhar focado, que deve dar medo nas rivais, desde o primeiro set. O quanto Julia Kudiess foi importante no saque, mesmo sem fazer um ace, na segunda parcial! O quanto Zé Roberto extravasou ao fim do jogo comemorando com sua comissão! O quanto o time todo do Brasil retribuiu o carinho e o apoio da torcida depois do triunfo. Uma noite para hoje e sempre!
Por Daniel Bortoletto, no Rio de Janeiro