Coluna: Os bastidores de uma final eletrizante
Por: Patrícia Trindade
Somos uma equipe enxuta no Web Vôlei. Na produção de matérias, somos dois: Eu e Daniel Bortoletto, editor-executivo do site. Para quem não sabe, somos casados. Éramos colegas de profissão e o vôlei nos uniu há quase 20 anos. Mas, essa é história para uma outra – e hilária – coluna, que farei em breve.
A coluna de hoje vai falar dos bastidores do jogão de ontem entre Sesi/Bauru e Osasco/São Cristóvão Saúde, pelo título do Paulista. Jogadoras, comissão técnica torcida se preparam para uma final. E jornalista também.
A produção na nossa redação começa cedo, normalmente com o Daniel produzindo matérias e eu nas redes sociais, mas no geral dividimos bem as funções.
Na escala de ontem, eu fiquei com o primeiro jogo do dia, pelo Campeonato Mineiro, entre Itambé/Minas e Brasília, às 18h; Daniel pegou o segundo, entre Dentil/Praia Clube e Renata/Valinhos, às 20h – que na verdade começou às 20h30 – e eu, já livre da primeira partida, peguei Sesi x Osasco para cobrir, a partir das 21h30. Já estava preparada para fortes emoções. Mas nada perto do que aconteceu.
Nem posso falar que é trabalho. Felizmente, trabalhamos com o que amamos. E cobrir uma final como essa, mesmo pela TV, mesmo sem torcida no ginásio, é emoção pura.
Nos dois primeiros sets, de frente para o computador, escrevi basicamente as escalações e algumas impressões rápidas: Tandara marcou 9 pontos no primeiro set, Polina e Tifanny estavam em quadra? Osasco mais confiante, Sesi inseguro… O texto ia por esse caminho.
Terceiro set: 8 a 2 para Osasco. Bauru sem rumo. Anderson leva o cartão vermelho. Começo a escrever de vez, já convencida de que a vitória osasquense seria por 3 a 0. Afinal, o texto precisa ser publicado logo após o fim do jogo, herança dos tempos do jornal impresso – Eu no Estado de Minas, no Correio Braziliense e depois no Jornal Metro – e Daniel no Lance! Tínhamos menos de 10 minutos para liberar a matéria, fosse qual fosse o esporte, mas principalmente o futebol, que sempre acabava muito tarde, porque senão o pessoal da gráfica – que ficava esperando os jogos da rodada de futebol acabar – ficava nervoso com a gente, atrasava a distribuição nas bancas, a logística ia por água baixo, ou seja: a pressão sempre foi liberar o texto rápido. Na internet não é diferente.
Comecei já a escrever a vitória de Osasco por 3 a 0, o 15º título da história do clube e tal… coloquei os placares até então (25-20, 27-25, 25-xx). Dali a pouco, 14 a 6 para Osasco. Acelero o texto. Vai acabar rápido. Hora de colocar o título: “Osasco arrasa o Sesi e conquista o Paulista”. Foto de comemoração osasquense, texto tomando forma, falando que Polina não apareceu para o jogo, que o Sesi parecia um time derrotado, assustado, entregue. Matéria praticamente pronta. Era só esperar o placar da última parcial.
Muita gente acha que jornalista faz isso para secar um ou outro time ou porque torce para alguém. Não. Faz para poupar tempo. Lembra? Sempre tivemos de entregar a matéria no laço, assim que o jogo acaba.
Foi quando começou a incrível reação de Bauru. Adenízia incendiou a partida. Botou fogo nas companheiras e o time reagiu. Eu, sentada na frente do computador, pensava: ok, o Sesi está até fazendo uns pontinhos, mas dificilmente vai virar o set. Me enganei. Empatou em 17 a 17 e virou: 19 a 17.
Já olho para a matéria tipo: vou ter de mexer. Começo a escrever que a apatia dos dois primeiros sets do Sesi diminuiu após Adenízia contagiar o time e colocar Polina, Fê Isis e Brenda no jogo. Mas ainda não mexo no lide nem no título. Bauru estava morto. Eu vi com os meus próprios olhos. O semblante das jogadoras num determinado momento em que todas olharam para o técnico Anderson era: “Não tem mais o que fazer”. Teria forças para ressuscitar?
Teve. Ressuscitou nas mãos de Adenízia. O improvável acontece: venceu o terceiro set. Começa o quarto. Adenízia acaba com o set. Polina e Brenda chamam a responsabilidade. Osasco parou de virar as bolas. Vamos para o tie-break. Tandara não vira, Adenízia bloqueia muito. Polina e Brenda seguem se agigantando. Sesi ganha o jogo. Já vi muitas viradas na minha vida de jornalista esportiva, claro. Mas essa seria épica, se realmente se concretizasse com o título. Incrédula, fico pensando que partes do texto poderia aproveitar? Quase nenhuma!
A essa altura não posso mais falar que o Sesi foi apático. Mudo todo o texto. Mudo o lide, mudo o placar. Quem ganhou o jogo foi o Sesi, tenho de trocar as parciais. Tiro o título, tiro o subtítulo, deixo em branco. Mexo no SEO, troco a legenda, coloco uma foto de stand by com a comemoração do Sesi. Tudo pode acontecer no sexto set. Estou cansada, com fome, coração batendo acelerado. Imaginem as jogadoras…
Olho para o sofá da casa. Passa da meia-noite. Todo mundo acordado. Daniel ajuda nas redes sociais e na busca das fotos. Nossos filhos adolescentes – 12 e 13 anos – na sala, assistindo ao jogo. Dou uma de mãe que precisa assumir o comando da casa:
– O que vocês estão fazendo aqui? Vão dormir!! Tem aula amanhã!
Ninguém se mexe, ninguém sai do sofá. Não insisto. Eu também não sairia. Quem pode parar de assistir a um jogo como esse? Independente do time para o qual você torce, mesmo se você não gosta de vôlei, era impossível não se empolgar com a entrega das duas equipes, com as vibrações, com as defesas, os ralis…
Jogadoras exaustas – e a gente também. Vamos para o golden set. Deu Osasco. Mudo todo o texto às pressas. Não dá mais para escrever que Polina foi péssima. 33 pontos praticamente nos últimos quatro sets – nos dois primeiros ela não compareceu. Faço uma análise acalorada. Não tem como ser fria num jogo como esse.
Daniel busca informações sobre as pontuações, sobre foto, pega frase, checa as redes sociais, os grupos de whatsapp bombando. 2 mil, 3 mil mensagens não lidas. Socorro. Libero o texto 5 minutos depois do ataque de Tandara que selou a vitória de Osasco. Erro um dos placares, corrige, falta vírgula, tem erro de de digitação, conserta. Texto revisado, aperto o botão de publicar!
Alívio. Estamos todos exaustos. Parece que passou um caminhão em cima da gente. E olha que nem entramos em quadra! Checamos os grupos, revemos o texto, olhamos as redes sociais das jogadoras, publicamos o material no Instagram, Facebook e Twitter. Baixa foto, vê se não tem nada errado.
Filhos vão dormir. Mas e a gente? Como dorme depois de um caminhão de adrenalina como esse? Não são só as jogadoras e a comissão técnica que suam a camisa numa final. A gente, que vive e respira o vôlei, também se cansa, se emociona. Se emociona com quem ganha e com quem perde.
Fome. Como alguma coisa, tomo banho e vou para a cama. Mas não consigo dormir. Ainda checo as redes sociais das atletas. Publico o vídeo de Jaque no vestiário. Uma vozinha me manda dormir, porque quarta-feira tem mais três jogos.
Boa noite. Foi mais um dia normal na redação do Web Vôlei. E a gente ama!