Homofobia Anderson Melo
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Destaques - Fora de Quadra - Praia - 4 de abril de 2024

Anderson Melo fala sobre trauma após sofrer homofobia

Abalado com episódio durante o Circuito Brasileiro, jogador pediu demissão de um dos empregos como professor de vôlei de praia


Vítima de homofobia durante o Aberto da segunda etapa do Circuito Brasileiro de vôlei de praia, no dia 14 de março, em Recife, Anderson Melo ainda tenta digerir o fato. O jogador, que é gay assumido desde os 15 anos, detalhou em entrevista à coluna “Olhar Olímpico”, do “Uol”, as consequências do trauma sofrido ao ser atacado com palavras ofensivas por grupo de torcedores durante toda a partida.

– Teve um grito que me chamou de ‘bicha’ e falou ‘Dá na cara dela, ela é mulher’. Isso me remeteu a quando eu contei à minha mãe que eu sou gay. Ela ficou abalada, ficou triste, balançou nossa amizade. Depois de um tempo ela falou que o problema dela não era com a minha sexualidade, mas como a sociedade iria me tratar, o que as pessoas poderiam fazer comigo. Ela via casos de agressão, já havia escutado histórias. Era o medo dela, e minha cabeça foi para esse momento – disse Anderson Melo, que não demonstrou reação no momento em sofreu os ataques.

– Me machucou muito dentro de quadra. Eu não tinha forças para sair de quadra, não tive forças para fazer o BO no dia. A única coisa que eu queria era sair dali. Não foi um minuto, não foram dois minutos. Foram 50 minutos.

O jogador responsabiliza a CBV pela falta de atitude diante do crime que sofreu. Ele contou que só foi procurado por Guilherme Marques, gerente de competições de vôlei de praia da entidade, mais de 12h após o fato, quando o atleta denunciou o caso pelo Instagram, incentivado pela amiga e ex-jogadora Maria Elisa, que teria dito as seguintes palavras ao atleta.

– Anderson, você está machucado, você está chorando, mas precisa entender que o que você passou é crime e outras pessoas no Brasil passam por isso diariamente. Você precisa ter força para você ser a voz disso – disse Maria Elisa, proprietária de um CT onde Andersom dava aulas.

A partida em que Anderson sofreu os ataques tinha como atração o atleta Fabiano Melo, de 48 anos, dono de um centro de treinamento na cidade, na Praia de Boa Viagem, e que estava de volta às quadras como jogador depois de uma década.

– As pessoas que estavam naquele momento eram torcedores do Fabiano. O meu jogo seguinte foi na quadra 3, e ele na 2, ao lado. A mesma torcida estava com ele na 2 – contou Anderson.

O jogador não se conforma com o despreparo dos envolvidos no evento para tomar uma medida imediata em meio aos gritos ofensivos.

– No segundo set, os organizadores estavam na quadra ao lado, e depois vieram dizer que não estavam identificando os gritos. Devia ter entre 20 e 30 pessoas no jogo. Eles podiam ter gravado, parado jogo, gritado, chamado a segurança, segurado todo mundo até a chegada da polícia, mas não fizeram nada”, conta Anderson.

Após a repercussão do caso, as duplas finalistas do torneio entraram em quadra carregando faixas com os frases “Homofobia é crime” e “Anderson Melo, essa luta é de todos!”.

A CBV se pronunciou por meio de nota e listou uma série de medidas tomadas para amparar o jogador.

Confira o que disse a entidade:

Como entidade que notadamente repudia qualquer tipo de preconceito, a CBV se mobilizou para apurar os fatos, reviu as imagens da partida, se reuniu com os envolvidos (atletas, arbitragem, delegado e supervisora de arbitragem), e recolheu todas as informações necessárias, incluindo os relatórios da árbitra de partida e do delegado técnico da competição.

No sábado, 16/3, a CBV prestou queixa e procedeu com o devido registro de ocorrência na Delegacia de Polícia da 7ª Circunscrição, em Boa Viagem.

A CBV também fez o encaminhamento do ocorrido ao Ministério Público local e ao Superior Tribunal de Justiça Desportiva do Voleibol, para que sejam tomadas todas as medidas legais cabíveis. A CBV está acompanhando os desdobramentos do caso e não medirá esforços para que os responsáveis sejam identificados e punidos.

No domingo, dia 17/3, data das finais da competição, a CBV fez uma ação de conscientização e de apoio a Anderson Melo, com a participação dos atletas. As duplas que jogaram naquele dia entraram em quadra com faixas com os dizeres “Homofobia é crime” e “Anderson Melo, essa luta é de todos!”. As faixas foram levadas ao pódio durante a cerimônia de premiação. O próprio Anderson agradeceu as ações em comentário nas redes sociais da CBV.

Na quinta-feira, dia 21/3, a CBV retornou à delegacia em Recife levando novas evidências, incluindo imagens, fotos e relatos que podem auxiliar na identificação de suspeitos. A CBV entende que, com isso, os responsáveis pelo caso têm relevantes evidências para identificar os responsáveis pelos atos homofóbicos.

Desde que os fatos foram apurados, a CBV mantém permanente contato com o atleta por meio de seu presidente, do Diretor de Relações Institucionais e do gerente de competições de vôlei de praia da CBV. Foram diversas conversas presenciais, por telefone e por aplicativo de mensagem. Anderson inclusive esteve na sede da CBV, na Barra da Tijuca, para uma reunião presencial, da qual participou o presidente da Comissão de Atletas de Vôlei de Praia. A CBV também ofereceu apoio psicológico ao atleta, e quando Anderson manifestou o desejo de continuar com a profissional que o atendia, a CBV se prontificou a arcar com os custos das consultas. A pedido de Anderson, a CBV arcou com os custos da viagem do presidente da Comissão de Atletas de Vôlei de Praia à etapa de Saquarema do Circuito Brasileiro, para que este desse suporte ao atleta durante a competição.