Estilo e métodos de Lavarini conquistam Minas
– Lavarini foi a melhor coisa que aconteceu no Minas nesses dois anos.
A frase acima é de Carol Gattaz, meio de rede e capitã do Itambé/Minas, e ajuda a entender o impacto do trabalho do treinador italiano Stefano Lavarini, contratado pelo clube na temporada passada.
Neste período, ele ajudou o Minas a encerrar a hegemonia do Dentil/Praia Clube no Campeonato Mineiro com dois títulos consecutivos, venceu um Sul-Americano, disputou e ficou com a medalha de prata no Mundial, além de ter conquistado a Copa Brasil, no início de fevereiro.
Resgatou também a auto-estima do Minas, recolocando o clube de Belo Horizonte como uma das potências do vôlei feminino.
Ao tomar conhecimento das palavras de Gattaz, a resposta do italiano demorou alguns segundos a mais para sair. Suspirou, coçou a cabeça e , um pouco constrangido, começou a falar.
– É emocionante ouvir palavras como essas da Carol, independentemente do fato de eu achar que as jogadoras sempre fazem as diferença. Primeiramente, o técnico não tem de arruinar nada, como um médico. Primeiro passo é não matar o paciente e depois conseguir fazer algo para melhorar a saúde dele. Mas é uma honra para mim, uma emoção grande, não sei como explicar o valor que essas palavras tem, além do vôlei. Vim para cá, uma cultura diferente, um desafio grande, em uma terra de vôlei tão importante. Simplesmente não queria me sentir inadequado. Queria descobrir uma forma de trabalhar com as meninas e acompanhar os resultados que elas merecem. Não sou um cara que faz muitos pensamentos otimistas de forma geral. Sou mais de fazer pensamentos racionais. A missão era grande, mas se não fosse grande não viria até aqui – disse o italiano ao Web Vôlei, depois da conquista da Copa Brasil, em Gramado (RS).
Ali, dentro da quadra do Ginásio Perinão, o técnico Lavarini mostrou um pouco mais do ser humano Lavarini. Interrompeu entrevistas para dar abraço em jogadoras, extravasou na comemoração com o grupo, demonstrando a sensação de dever cumprido.
– Estava pensando em uma frase que falei para a minha família antes de vir para o Brasil: “Se não der certo profissionalmente, vai ser uma experiência de vida importante”. Agora acho que estou atingindo os dois objetivos: o pessoal e o profissional – admitiu o italiano.
A conquista do grupo, porém, não foi instantânea. Quem garante é Keyla Monadjemi, diretora de vôlei feminino do Minas, e uma das responsáveis pela contratação de Lavarini.
O italiano chegou ao Brasil após estudar adversários, jogadoras do elenco e aprender o português. Mostrou-se estudioso ao extremo para desbravar um país com o qual não tinha muita ligação. Desembarcou também com um estilo de jogo definido e implantado desde os primeiros treinamentos.
– Stefano é um cara extremamente inteligente, perspicaz, atualizado, que trouxe para nós uma cultura diferente. No começo, as meninas precisaram se adaptar. Ele tem uma intensidade muito mais forte no treinamento, mesmo que isso precise diminuir o tempo de treino. E isso preocupou as jogadoras, no começo foi um pouco estranho. Ele é muito direto, muito claro, ganhando ou perdendo é o mesmo estilo de jogo. Então isso passa uma confiança muito grande para as jogadoras, porque não depende de estar na frente ou atrás . Pode estar 24 a 18, que a nossa preocupação é imprimir o ritmo de jogo, a nossa velocidade… Nunca vi um time feminino jogar com essa velocidade! O que a Macris está jogando é outro patamar, me lembra muito o Ricardinho. Gabi, Natália e Bruna Honório batendo bola com uma velocidade muito grande, porque é o jeito que ele quer que o time jogue. E ele deixou isso muito claro no começo. Ele coloca uns vídeos de jogos internacionais e fala: “Quero que você faça esse tipo de bola”. E as jogadoras tem de comprar a ideia, porque senão não funciona. Está perdendo, está um pouquinho atrás? Continua forçando o saque, empina a bola, velocidade do mesmo jeito – contou Keyla.
Aos 37 anos, Carol Gattaz vive o ápice da carreira. Demonstra uma sintonia quase perfeita com Macris nas bolas rápidas pelo meio. E vê grande parte do bom momento fruto do trabalho do treinador:
– Eu estou na minha quinta temporada no Minas. Ele chegou e deu um tempero a mais ao nosso time. É um cara que ao mesmo tempo é super brincalhão, é sério, é muito estudioso. Ele joga com a gente, dá força, está ali em pé o tempo todo, está sempre com a gente. Espero que ele continue por muitos anos no Minas, pois ele só tem a acrescentar ao voleibol brasileiro.
A conquista de BH fez Lavarini ter a oportunidade de alçar voos mais altos e sonhar com o mundo. Em janeiro, ele foi confirmado como treinador da seleção feminina da Coreia do Sul. Em agosto, buscará garantir uma vaga olímpica para as asiáticas nos Jogos de Tóquio-2020.
– Não sei se a maioria das pessoas entende ficar longe de tudo, da família, da casa, mudar a própria vida. Eu escolhi aproveitar essa oportunidade. O pensamento é como qualquer desafio: ou você pega e encara como qualquer desafio ou volta pra casa. Poderia ser o técnico de um time ali perto da minha casa, ficar perto, aproveitar a família. Poderia aproveitar a minha mãe, eu já estou sem pai, só com um irmão, que precisaria da ajuda de um irmão mais velho. Então estou largando tudo isso, não posso parar na frente de nenhuma oportunidade. Podem acontecer derrotas, fracassos, mas tudo isso me move para chegar mais longe possível.
O acerto com a Coreia não significa automaticamente o fim da passagem de Lavarini pelo Minas. O começo do trabalho acontecerá ao término da Superliga. Na volta, a ideia do clube é fazer com que ele se divida entre clube e seleção, algo até comum no cenário do vôlei atual.
– O nosso objetivo nunca foi curto prazo, a ideia é manter o trabalho, algo que seria espetacular. Quase todos os grandes treinadores estão ou estiveram no clube e numa seleção. Bernardinho, Zé Roberto, Marcelo Mendez, agora o Horácio (Dileo)… Essa não é uma preocupação do clube, pelo contrário, a gente fica feliz, porque era um objetivo pessoal do Stefano. Ficamos felizes por ele. Ele vai estar participando de um dos maiores eventos esportivos do mundo, a Olimpíada, com as principais atletas, treinadores, assistentes, jogadores. Esse é o objetivo profissional de todos – comentou Keyla.
Por Daniel Bortoletto
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